Cultura

Às 3 da madrugada, uma ideia movimentou minha vida profissional

Reescrever livros pode ser desafiador, mas a recompensa vale a pena. Veja como enfrentei essa jornada

Com mais de 400 mil exemplares vendidos, conheça a trajetória do livro que revolucionou minha forma de escrever - Imagem: Divulgação

Reinaldo Polito Publicado em 05/09/2025, às 10h27

Como uma ideia revolucionária na minha vida, aparentemente vinda do nada, surgiu às 3 da madrugada? Se me pedissem uma explicação razoável, o máximo que eu poderia dizer, pirateando Chicó no Auto da Compadecida, seria: “Não sei, só sei que foi assim”. Há um fato concreto, mas “perscrutar sua exegese” é que são elas.

Passava das 3 horas da madrugada. Eu estava admirando alguns dos meus livros. Acabara de modificá-los. Quando os escrevi pela primeira vez, caprichei. Ficaram ótimos. Elaborados com rigor técnico e linguagem escorreita. Descobri mais tarde, ao atuar como colunista em revistas, jornais e portais, que, para prender o leitor, deveria desenvolver um texto leve, instigante e atraente. Aprendi.

Pareciam textos de autores distintos

Sim, se o texto fosse bom mas “rígido”, desestimularia o leitor, especialmente os que navegam pelas páginas dos portais na internet. Na primeira frase longa, truncada, sem fluência natural, com um simples clique já estaria no artigo logo ao lado. Por isso, errando e acertando, mais errando que acertando, fui descobrindo o caminho das pedras.

Ao comparar esses novos textos com os livros “cuidadosamente elaborados” dava a impressão de terem sido produzidos por autores distintos. Como me apaixonara pela nova versão, pensei em atualizá-los. Sofri pressão para não abraçar essa aventura. Conselho de amigo, dos melhores que tenho.

Exemplar russo de "Superdicas para falar bem"

 

Conselho de amigo

Com sua larga experiência no mundo editorial, Nilson Lepera, diretor comercial da Editora Saraiva, me alertou: “Politão, não entre nessa roubada. Vá por mim, dá mais trabalho reescrever um livro que fazer um novo. Normalmente, quem tenta, acaba por desistir no meio do caminho. Reescrever todos esses, então, pode desistir”.

Insisti. Mas, e se eu quiser, você publica? Ele riu e devolveu: “Faça o que achar melhor, mas não diga que não avisei”. Ele tinha razão. Foram meses de noites indormidas e finais de semana sem ao menos tirar o pijama naquela interminável tarefa. Doeu, mas completei a aventura. O Nilson cumpriu a promessa e publicou.

Exemplar espanhol de "Superdicas para falar bem"

 

Uma boa história para contar

Agora explico aquela incompreensível madrugada. Eu ali na minha escrivaninha, feliz da vida, com todos os livros publicados com a nova linguagem. Olhei para um lado, para o outro, ninguém. Bati no meu ombro e ‘me cumprimentei’: “Boa, garoto, que belo trabalho. Ainda bem que não desistiu. Exigiu muito esforço, mas agora está tudo do jeito que você queria”.

Eu ‘me agradeci’. Sabia que essa seria uma boa história para contar. E quem me conhece sabe: se for conquista intelectual, não tenho escrúpulo nenhum em contar vantagem.

Exemplar inglês de "Superdicas para falar bem"

 

Se aparecer, não, já apareceu

Nesse momento, bateu uma preocupação: “Puxa, tanto trabalho, tanta dedicação para escrever obras com tanta profundidade mas posso ficar chupando o dedo. Pois é, se aparecer alguém escrevendo um livro mais direto e objetivo pode fazer sucesso e eu aqui, depois de tanto sacrifício, só me restará bater palma”.

Foi aí que deu um estalo e surgiu a ideia sem um motivo concreto: “Espera lá. Se surgir alguém não, esse cara já apareceu, sou eu mesmo”. Naquele mesmo momento, comecei a reunir material para escrever um livro de “dicas para falar bem”. No final, mudei para um título mais pomposo: Superdicas para falar bem em conversas e apresentações.

Mais de 400 mil exemplares

O projeto contemplava um livro em formato de bolso, com 60 dicas, cada dica com tamanho entre 1.550 a 1.750 caracteres. Tive de meter a tesoura em muitos capítulos para que se enquadrassem a esse tamanho. Levei para a Saraiva, já com a capa pronta, e garanti: “Se publicarem, vai fazer sucesso”.

Publicaram. E fez sucesso. Muito sucesso. Já vendeu mais de 400 mil exemplares. Ficou cerca de três anos nas listas dos mais vendidos. Os olhos da editora cresceram: “Polito, essa ideia do superdicas foi muito boa. Por que você não escreve sobre outros assuntos com essa marca?”.

Exemplar italiano de "Superdicas para falar bem"

 

Nasceu a série

Fui firme. Só falo sobre comunicação. Mas como o projeto é meu, posso coordenar uma série superdicas e buscar os melhores especialistas para escreverem sobre temas da sua área. Publicamos 30 títulos. Deu muito certo. Venderam mais de um milhão de exemplares. Conseguimos colocar em uma mesma edição da revista Veja, na lista dos mais vendidos, seis títulos.

O meu livro foi publicado na Itália com o título I Superconsigli parlare bene per convincere ed essere protagonista. Graças ao volume elevado de vendas também lá, passei a coordenar a série I Superconsigli. Os títulos da série mais vendidos aqui no Brasil eram publicados também no mercado italiano.

E assim, de uma ideia que até hoje tento descobrir como surgiu naquela madrugada, nasceu algo de importância fundamental na minha vida profissional, tanto de professor de oratória quanto de escritor. A melhor explicação até aqui parece ser essa que já dei: “Não sei, só sei que foi assim”. Siga pelo Instagram: @polito

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