Cultura

Alckmin é o melhor negociador do Brasil

Encontro entre Brasil e EUA traz à tona questões espinhosas que exigem habilidade e estratégia nas negociações

Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Reinaldo Polito

por Reinaldo Polito

Publicado em 10/10/2025, às 10h43


O Brasil vai enfrentar os Estados Unidos. Pode parecer pesado, mas não há dúvida de que será um enfrentamento. Do lado americano, Trump escalou Marco Rubio, um osso duro de roer. Para representar o Brasil, Lula indicou três nomes: o vice-presidente Geraldo Alckmin, o ministro da Fazenda Fernando Haddad e o ministro das Relações Exteriores Mauro Vieira.

Haddad, por ser ministro da Fazenda, tem tudo a ver com as questões econômicas, portanto, justificado. Mauro Vieira, como chanceler, está familiarizado com o ambiente diplomático, também legitimado.

Alckmin é craque em negociações

E Geraldo Alckmin? Está certo que, por ser vice-presidente, num embate importante como esse, teria autoridade suficiente para participar. Mas será que a sua presença poderia ser explicada apenas pela posição hierárquica? Sim e não.

Sim, porque não se admitiria qualquer pessoa nessas tratativas. Não, porque ele é, se não o melhor, um dos melhores negociadores do país.
Pode parecer ousado dizer que Alckmin é o melhor negociador do Brasil, mas, até hoje, ninguém apresentou um nome que o supere em preparo, serenidade e competência no embate.

Quando Lula precisou participar dos debates com Bolsonaro na campanha presidencial de 2022, em tom de brincadeira, mas com bastante fundo de verdade, recomendei em um texto no UOL que o petista delegasse esse compromisso ao seu candidato a vice. Isso jamais poderia acontecer, mas que teria sido bom, teria.

Ninguém supera Alckmin em um debate

Alckmin é um exímio debatedor. Nunca perdeu um duelo. Quando se confrontou com Lula, quem analisou com frieza e distância cravou a vitória para o ex-governador. Analisei esse e outros debates no artigo “Lula prova, mais uma vez, que é ruinzinho de debate”, publicado há três anos na Jovem Pan.

Em 2014, ao disputar o governo de São Paulo, venceu em 644 dos 645 municípios. Chegou ao Palácio dos Bandeirantes com 57,31% dos votos, contra 21,53% de Paulo Skaf e 18,22% de Alexandre Padilha.

Massacrou Genuíno

Em 2002, sua vítima foi José Genuíno. O petista sempre foi considerado articulado e bom orador. Havia grande expectativa sobre essa disputa. Os próprios aliados de Genuíno se surpreenderam com o massacre.

A cada ataque do adversário, Alckmin respondia com segurança, apresentando dados que refutavam imediatamente os argumentos. Tinha os números na cabeça, dominava as estatísticas e os estudos. Não havia informação sobre a qual não estivesse inteirado.

Obteve resultado pífio nas eleições presidenciais de 2018, 4,76% dos votos. Naquela campanha ninguém venceria Bolsonaro. Para muitos, essa derrota marcava o fim da carreira política do ex-governador.

Um vice dos sonhos

Em 2022, renasceu das cinzas. Em um acordo surpreendente, compôs a chapa com Lula e chegou à vice-presidência da República. Discreto, jamais tentou ofuscar a imagem ou as iniciativas do presidente.

Toda essa experiência, governando São Paulo por mais de uma década, lidando com crises, pressões e negociações, somada ao dom natural de guardar na memória números, datas e cifras, faz dele o nome ideal para um momento como este.

A outra parte é poderosa

Suas chances de sucesso, todavia, são mínimas. Do outro lado estará Marco Rubio, poderoso representante de Trump nas relações internacionais, especialmente na América Latina.

Esse descendente de cubanos foi responsável por impor sanções a Alexandre de Moraes, à sua esposa e ao escritório da família com base na Lei Magnitsky, além do cancelamento dos vistos de oito ministros do STF e do procurador-geral da República.

As conversas não serão amenas. Rubio levará à mesa temas espinhosos: a prisão de Bolsonaro, a alegada perseguição a adversários políticos, a liberdade de expressão, a regulação das Big Techs e a taxação de 50% sobre produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos.

Risco de sair com as mãos abanando

Mesmo que Alckmin alegue, com razão, que, exceto a taxação, os outros assuntos são prerrogativas do Judiciário e do Congresso, Rubio estará preparado. Terá refutações à altura.

Nada impede que ele peça aos representantes brasileiros que retornem ao país, conversem com o presidente e tentem persuadir o Judiciário a mudar sua forma de agir. Caso contrário, as sanções continuarão, independentemente de qualquer conversa que Trump tenha com Lula.

Alckmin é bom, talvez o melhor para essa jornada de negociações, mas irá com as mãos amarradas, sem ter o que oferecer, apenas a pedir. Negociar assim não é fácil. A não ser que tenha uma carta na manga que todos desconhecemos. Em política, tudo é possível. Siga pelo Instagram: @polito