Chega com sua luz avassaladora, como na obra de Van Gogh
por Marlene Polito
Publicado em 17/12/2024, às 12h28
O verão no Brasil começa oficialmente no dia 21 de dezembro e vai até 20 de março, seguindo o calendário astronômico. É a época mais quente e iluminada do ano. Chega com sua luz avassaladora, como na obra de Van Gogh, preenchendo as ruas de vida e, paradoxalmente, convidando a alma a uma reflexão silenciosa.
Verão e uma forma de explicar os ciclos da vida
Esse período de intensidades e transformações nos conduz aos ciclos da vida e das estações, que há séculos são desvendados pelo mito grego de Perséfone. Mais do que uma simples narrativa mitológica, a história de Perséfone atravessa os tempos como uma representação das forças naturais e emocionais que moldam a existência humana.
Perséfone era filha de Deméter, deusa da agricultura e da fertilidade, e juntas viviam felizes, rodeadas pelos campos floridos. Um dia, Hades, deus do submundo, apaixonou-se por Perséfone e a raptou, levando-a para seu reino escuro. A dor de sua mãe fez com que a terra murchasse, mergulhando o mundo em um inverno eterno. Preocupado com a destruição, Zeus interveio e propôs um acordo: Perséfone passaria metade do ano com Hades e a outra metade com sua mãe. Quando Perséfone retorna à superfície, Deméter, radiante, faz as flores brotarem e a vida renascer, marcando a primavera e o verão. Quando ela desce ao submundo, Deméter, tomada pela tristeza, deixa a terra murchar, dando lugar ao outono e ao inverno.
Assim como o mito de Perséfone, o verão simboliza apogeus e transições. É o ápice da luz e da vida, mas também carrega em si o prenúncio da mudança inevitável. Ao mesmo tempo que celebra a plenitude, ele nos lembra da fragilidade e da impermanência de tudo.
A Grande Onda de Kanagawa: Enfrentando os Desafios
A grande onda, xilografia de Katsushika Hokusai (1830 ou 1831)
Essa dualidade — o ímpeto da energia e o convite à introspecção — encontra eco na força retratada em A Grande Onda de Katsushika Hokusai. A obra captura um momento em que a natureza revela sua grandeza implacável, com a onda gigantesca ameaçando pequenos barcos à deriva. Assim como o verão, a onda é avassaladora, mas também efêmera. Em um instante ínfimo, ela encarna a tensão entre movimento e quietude, caos e harmonia.
O verão também carrega esses extremos: é tempo de energia vibrante, mas também de momentos de contemplação e silêncio.
Ninfeias e a serenidade na impermanência
Ninfeias, de Claude Monet (1906)
Enquanto Hokusai traduz a força da natureza em movimento, Claude Monet explora sua serenidade na série de pinturas Ninfeias ou Nenúfares. Monet buscava muito mais do que a simples representação de um lago coberto de flores. Suas intenções eram profundamente ligadas à atmosfera, ao jogo de luz e à experiência emocional que a obra poderia despertar, trazendo não apenas uma representação artística da natureza, mas também uma expressão de sua própria busca pela beleza e pela paz interior.
As Ninfeias capturam um momento em que a impermanência se revela, em um instante fugidio de uma luz que nunca se repetirá. Tudo está em constante movimento; há, porém, uma quietude que instiga à reflexão e à contemplação.
A obra torna-se, por isso, uma verdadeira metáfora das emoções humanas: o verão vem com seus extremos — alegria vibrante e momentos de melancolia que a luz intensa pode revelar.
O Olhar para o Próximo e o Familiar
Nighthawks, de Edward Hopper (1942)
Por fim, não podemos deixar de lado o contraste entre a agitação externa e a solidão interior que o verão pode trazer. As ruas cheias, repletas de passos apressados e vozes animadas, podem conviver com um silêncio introspectivo, como capturado nas obras de Edward Hopper.
Suas telas, como Nighthawks, revelam a solidão em meio ao movimento urbano, uma sensação que muitos experimentam no auge do verão: a aparente contradição entre a efervescência externa e o espaço vazio que pode habitar em cada um de nós.
Escolhas e Recomeços
O mito de Perséfone é um convite para aceitarmos os ciclos, enfrentarmos as ondas e encontrarmos beleza tanto na luz quanto na sombra. Assim como ela retorna à superfície para trazer a primavera, também somos capazes de renascer a cada desafio.
Monet, Hokusai, Van Gogh e Hopper nos mostram que o olhar é tudo: olhar para além do medo, olhar para o que nos conecta, olhar para a beleza que esquecemos de ver.
Marlene Theodoro Polito é doutora em artes pela UNICAMP e mestre em Comunicação pela Cásper Líbero. Integra o corpo docente nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão Corporativa e Gestão de Comunicação e Marketing na ECA-USP. É autora das obras “A era do eu S.A.” (finalista do prêmio Jabuti) e “O enigma de Sofia”. [email protected]
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